Panorama dos aspectos técnicos de moradias autoconstruídas: uma revisão narrativa
A autoconstrução é o processo no qual os próprios moradores assumem diretamente a gestão da produção de suas moradias, adquirindo ...
Atender a uma demanda energética mundial crescente e ao mesmo tempo reduzir as emissões de gases de efeito estufa é certamente um dos maiores desafios deste século. A transição energética se dará por um processo gradual de descarbonização da economia, pela substituição de combustíveis fósseis por renováveis e captura de CO2 gerado por fontes estacionárias. Dessa forma, é possível atuar sobre o nexo CO2-energia, em que se destacam mundialmente entre os principais emissores de CO2 os setores de geração de energia elétrica e de óleo e gás. Para estimular a adoção de novas tecnologias mais sustentáveis, em atenção aos acordos internacionais em mudanças climáticas, espera-se que a pressão governamental atue como elemento impulsionador para o abatimento das emissões de gases de efeito estufa nos diversos setores.
O Brasil é um dos países líderes em utilização de energia renovável, mas quando o suprimento de energia elétrica precisa ser complementado, são acionadas usinas termelétricas, que contribuem para o aumento das emissões de CO2. No exterior, estas são utilizadas em maior escala, sendo responsáveis ainda pela maior parcela da matriz elétrica mundial. Adicionalmente, espera-se nas próximas décadas um aumento global no consumo de gás natural como combustível, o que parece desafiar o nosso esforço em reduzir as emissões de CO2. Este cenário se aplica também ao Brasil, tendo em vista a necessidade de aproveitamento do gás da bacia de Santos e a inauguração recente de diversos terminais de regaseificação de gás natural liquefeito pelo país. Para conter o avanço do aquecimento global, como forma de responder rapidamente à necessidade de abatimento, a implementação de técnicas de captura, utilização e armazenamento de CO2 (CCUS) constitui uma alternativa importante para a descarbonização de fontes estacionárias. Sistemas de CCUS em geral são capazes de reduzir 90% das emissões de CO2 e podem também ser vantajosamente acoplados a processos de combustão de biomassa ou biogás, pela possibilidade de remoção indireta de CO2 atmosférico pelo ciclo de vida do carbono (bioenergia com captura e sequestro de carbono) [1].
Na geração termelétrica, a captura de CO2 pode seguir rota de pós-combustão, pré-combustão ou oxicombustão, conforme ilustra a Figura 1. O sistema completo compreende separação, compressão e transporte para destino final do CO2, que pode ser a utilização – para monetizar a corrente produzida – ou o armazenamento em reservatório geológico. Apesar da necessidade de abatimento das emissões e de já existir tecnologias maduras para implantação de algumas vias CCUS, poucos projetos comerciais têm sido implementados, tanto pela baixa atratividade econômica e alto custo da captura de CO2 quanto por desafios técnicos e econômicos de viabilizar uma infraestrutura de destinação de CO2, que se aliam à necessidade de políticas ambientais de baixo carbono. Toda esta conjuntura evidencia a importância de desenvolver novas alternativas tecnológicas para a descarbonização do setor energético [2].
OXICOMBUSTÃO
A oxicombustão se baseia no uso de oxigênio praticamente puro em substituição ao ar para injeção na câmara de combustão do processo, havendo necessidade de promover reciclo parcial de produtos da combustão (ex.: água/vapor e/ou CO2) para o controle de temperatura. A vantagem do método consiste na produção de um gás constituído basicamente por CO2 e H2O, para que o CO2 possa ser obtido facilmente após resfriamento e condensação da água. Com isso, é possível substituir uma etapa de remoção de CO2 de corrente gasosa por uma etapa de separação do ar, senda a única rota capaz de capturar 100% do CO2 gerado. Atualmente, a
geração de potência por oxicombustão constitui uma via não-convencional de captura, apresentando nível de maturidade tecnológica de demonstração industrial (TRL 7) para combustíveis sólidos e de bancada de prototipagem (TRL 4) para turbinas a gás, onde o desafio se concentra no projeto mecânico e termofluidodinâmico dos principais equipamentos [3].
O desenvolvimento de tecnologias eficientes para separação do ar é também um fator crítico para a competitividade econômica dos sistemas baseados em oxicombustão. Nestes sistemas, a maior parte da penalidade energética se concentra na produção do oxigênio. Plantas de fracionamento do ar são sempre intensivas em energia e capital e, atualmente, a separação criogênica é a opção mais econômica para atender o perfil de demanda de uma plausível planta de capacidade típica (0.1-1 GW) com emissão zero de carbono. Nesse contexto, o desafio de tornar a oxicombustão competitiva com processos convencionais – em que se realiza separação de CO2 pós-combustão – está muito associado à redução da potência requerida por compressores na planta criogênica de oxigênio.
SEPARAÇÃO CRIOGÊNICA DO AR
Por mais de 100 anos, plantas criogênicas de oxigênio têm utilizado o conceito de duas (ou mais) colunas de fracionamento termicamente acopladas, uma das quais com o propósito de gerar nitrogênio líquido para alimentação do topo da outra coluna, de menor pressão. A utilização dessa coluna de nitrogênio não é essencial para a produção de oxigênio [4] e é bem conhecido que há uma janela ampla de possível redução da demanda energética para separação do ar, o que pode ser verificado por uma análise global do processo pela ótica da segunda Lei da Termodinâmica [5].
Recentemente, uma tecnologia desenvolvida na Universidade Federal do Rio de Janeiro [6] demonstrou que a destilação com recompressão criogênica de vapor de topo oferece uma via de baixo consumo energético para a produção de oxigênio, sendo a demanda de potência avaliada por tonelada de O2 (139 kWh/t O2) [7] significativamente inferior à da planta mais eficiente até então já descrita na literatura (158 kWh/t O2) [8]. Em uma das formas preferenciais de concretização da nova tecnologia (TVR-2REB), ilustrada na Figura 2, utiliza-se uma coluna única de fracionamento operada em pressão próxima à atmosférica, onde uma parte do vapor de topo (nitrogênio em baixa pressão) é comprimida sob condições criogênicas, para depois ser resfriada e então enviada para um refervedor intermediário da coluna. A condensação do nitrogênio pressurizado ocorre neste trocador, que ao mesmo tempo ferve um líquido enriquecido em O2. Por evitar a troca de calor latente com O2 puro, isso permite reduzir a razão de compressão do nitrogênio. Já liquefeito, o nitrogênio é então enviado para resfriamento adicional, para depois ser devolvido como refluxo líquido ao topo da mesma coluna de fracionamento. No fundo, o oxigênio líquido é fervido por troca térmica com ar em liquefação, que depois irá alimentar a coluna. O processo desenvolvido requer uma pressão bem menor no fornecimento de ar para o fracionamento, evita compressão desnecessária do O2 contido no ar [4], e ainda facilita a separação ao diminuir a razão de refluxo requerida, por promover alimentação de ar parcialmente liquefeito e reduzir a volatilidade relativa de N2/O2 [7]. O processo proposto encontra-se registrado como patente, concedida no Brasil pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) sob o nº BR102016022807-7 [6]. O campo de aplicação se estende para além dos processos de oxicombustão. Pode ser aplicado tanto para a produção de oxigênio de baixa pureza (<95%) como de alta pureza (99.5%), exigindo menor consumo energético [7].
ESTUDOS DE VIABILIDADE ECONÔMICA
Em um estudo recente [7], avaliou-se a aplicação da nova planta de oxigênio TVR-2REB para suprir uma termelétrica de larga-escala com emissão zero de CO2 por oxicombustão, operando com ciclo combinado de gás natural. A análise do sistema é motivada pelo invariável ganho econômico que a nova tecnologia de separação do ar é capaz de proporcionar. O conjunto teve seu desempenho econômico (em valor presente líquido) comparado ao de uma planta convencional sem captura de aprox. 350 MW, sujeita a diferentes cenários de taxação de CO2. Nesse contexto, o indicador taxação break-even por CO2-equivalente é usado também como forma de distinguir o desempenho das alternativas (embora esta política de estímulo não esteja presente na maioria dos países). Considerando uma plausível contribuição em receitas pela utilização do CO2 para recuperação avançada de petróleo, qualquer cobrança governamental acima de 13,5 USD/t CO2 conduz a um maior potencial lucrativo do sistema de oxicombustão com emissão zero [7]. Em um outro estudo [1], em que também se considera o uso da TVR 2REB, foi avaliado o uso de biogás de aterro como combustível em menor escala para a geração de energia elétrica. Mesmo sem incorporar contribuição de receitas ao fluxo de caixa pela monetização do CO2 capturado, a rota de bioenergia com emissão zero revelou melhor desempenho econômico a partir de 50 USD/t CO2 quando comparada à separação convencional de CO2 pós-combustão, via absorção química com monoetanolamina 30%w (que ainda emite 10% do CO2 de seu gás exausto), sendo mais lucrativa do que uma planta sem captura submetida a taxas superiores a 95 USD/t CO2 [1]. Desses dois estudos verifica-se, para além do impacto de economia de escala, a importância de agregar contribuição adicional ao caixa pela utilização do CO2 capturado.
Conclui-se que o processo TVR-2REB constitui uma tecnologia nacional que permite contribuir globalmente para a eficiência energética na produção de oxigênio gasoso em larga escala. O uso industrial de oxigênio se estende hoje por diversos setores, especialmente na metalurgia e na petroquímica, entre outros. Considerando as diversas aplicações e amplo mercado consumidor de oxigênio, o novo conceito pode certamente contribuir com benefícios ambientais e econômicos para a sociedade em geral, e ao setor de energia e de gases industriais em particular, minimizando a utilização de recursos naturais e a emissão de CO2 ligada ao consumo desses recursos. Nesse contexto, a oxicombustão constitui um possível novo mercado consumidor de oxigênio em larga escala, onde se espera que exija a construção de uma ou mais plantas em paralelo exclusivas para suprimento onsite. Como técnica não-convencional para capturar CO2, apresenta vantagens sobre a pós-combustão sob várias perspectivas, especialmente no que diz respeito ao desempenho ambiental. Foram apresentados exemplos de estudos econômicos em que se verificou possível benefício da adoção da oxicombustão e algumas condições que podem proporcionar isto, levando em consideração o novo avanço no estado-da-arte, no que para esta rota constitui o processo de separação principal.
Referências
[1] Brigagão GV, de Medeiros JL, Araújo OQF, Mikulčić H, Duic N. A zero-emission sustainable landfill-gas-to-wire oxyfuel process: bioenergy with carbon capture and sequestration. Renewable and Sustainable Energy Reviews, 138, 110686, 2021. https://doi.org/10.1016/j.rser.2020.110686
[2] Brigagão GV. Technological alternatives for carbon abatement and exergy efficiency: power generation, processing of CO2-rich natural gas, and biorefineries. Tese (Doutorado em Engenharia Ambiental), Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2019.
[3] Bui M, Adjiman CS, Bardow A, Anthony EJ, et al. Carbon capture and storage (CCS): the way forward. Energy & Environmental Science, 11, 1062, 2018. https://doi.org/10.1039/c7ee02342a
[4]FuC, GundersenT.Recuperative vaporrecompression heatpumpsin cryogenic airseparation processes. Energy, 59, 708-718, 2013. https://doi.org/10.1016/j.energy.2013.06.055
[5] Fu C, Gundersen T. Using exergy analysis to reduce power consumption in air separation units for oxy-combustion processes. Energy, 44, 60–68, 2012. https://doi.org/10.1016/j.energy.2012.01.065
[6] Brigagão GV, de Medeiros JL, Araújo OQF, inventores; Universidade Federal do Rio de Janeiro, depositante. Processo de destilação criogênica para separação do ar para produção de oxigênio gasoso. Pedido de Patente BR102016022807-7. Instituto Nacional da Propriedade Industrial. Depósito em 30 Set. 2016. Concessão em 30 Set. 2022.
[7] Brigagão GV, de Medeiros JL, Araújo OQF. A novel cryogenic vapor-recompression air separation unit integrated to oxyfuel combined-cycle gas-to-wire plant with carbon dioxide enhanced oil recovery: energy and economic assessments. Energy Conversion and Management, 189, 202-214, 2019. https://doi.org/10.1016/j.enconman.2019.03.088
[8] Higginbotham P, White V, Fogash K, Guvelioglu G. Oxygen supply for oxyfuel CO2 capture. International Journal of Greenhouse Gas Control, 5S, S194–203, 2011. https://doi.org/10.1016/j.ijggc.2011.03.007
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